domingo, 3 de janeiro de 2010

A Vergonha de Casoy e a Invisibilidade Social

Para comemorar o ano novo passei o último fim de semana em uma fazenda sem ver TV e sem acesso a internet, acabei sabendo só hoje da polêmica envolvendo Boris Casoy, âncora famoso pela utilização do bordão "Isso é uma Vergonha" e por criminalizar movimentos sociais e a esquerda em geral, e que segundo comentam já esteve envolvido com o CCC (Comando de Caça aos Comunistas). Após o Jornal da Band veicular uma matéria sobre garis em que no final esses desejam feliz natal, Casoy ironizou os votos com o seguinte comentário:

"Que merda: dois lixeiros desejando felicidades do alto da suas vassouras. O mais baixo na escala do trabalho".

Claro que ele não disse isso diretamente para as câmeras, mas em off, porém o áudio vazou enquanto passava a vinheta e todos ouviram o comentário preconceituoso seguido por gritos desesperados provavelmente do responsável pelo som: "Deu pau, deu pau, deu pau..."

No dia seguinte Casoy ainda tentou "pedir desculpas profundas pelo comentário infeliz” (sic), mas o estrago já estava feito, nesse tempo de internet é difícil colocar no esquecimento um comentário como esse como aconteceu com o "coisa de viado" que o Pedro Bial comentou no Fantástico após a transmissão de uma noticia sobre balés, quando muito tempo depois esse vídeo caiu na internet o barulho já tinha sido abafado, no caso de Casoy praticamente no mesmo dia isso já era assunto e ninguém falava em outra coisa, o vídeo no Youtube fez sucesso e quase todo mundo comentou no Twitter.

Casoy explicitou algo que nós brasileiros temos dificuldades em reconhecer, o preconceito social, assim como o racial ainda existe, conheço pessoas que se incomodam em morar em um prédio que não tenha elevador social, que acha que festa de empresa tem que ser separada e que um garçom não deve nunca fazer um comentário para as pessoas da mesa que não seja "o que deseja" ou "bom apetite". É difícil reconhecermos que não somos o país que respeita a diversidade, o país em que pobres, ricos, negros e brancos convivem em total sintonia.

No fundo todos Querem que os pobres apenas façam seu trabalho e se mantenham na sua só se dirijam aos demais quando forem perguntar algo útil relacionado ao trabalho. No livro "Homens Invisíveis - Relatos de uma Humilhação Social” (Editora Globo, 2008) o psicólogo Fernando Braga da Costa que conviveu 10 anos com os garis da Cidade Universitária da USP, trabalhando junto deles e uniformizado como eles relata como esses trabalhadores são humilhados por aqueles que têm que lhes dar as ordens e como são ignorados pelos demais como se fossem invisíveis, como se não fossem pessoas mas apenas a parte feia da decoração da cidade que não merece nada mais que o desprezo. Fernando sentiu na pele toda a labuta dos garis, mexendo em lixo tóxico sem utilização de máscara ou roupa especial, varrendo debaixo de chuva ou sol, aguentando humilhações e enfrentando o desaparecimento proporcionado pelo uniforme, o próprio autor deixava de ser percebido por alguns amigos e professores quando utizava a roupa própriados trabalhadores.

Infelizmente casos como o de Casoy não são raridade nesse país, essas pessoas da "mais baixa escala de trabalho" precisam aguentar todos os dias esse tipo de insulto, além de sofrer com baixos salários e falta de perspectivas. Imagine um desses sujeitos animado por aparecer na TV, chega em casa e chama família e amigos para assistir o telejornal, compra uma cerveja e reúne todos na sala apertada e quando finalmente se encerra a reportagem tem a decepção de ouvir esse comentário esnobe. Em Homens invisíveis Fernando relata o quanto ficou magoado quando uma garota pré-adolescente ironizou um dos garis que trabalhavam com ele. O quanto se sentiu mal pensando em um senhor que sai de casa para fazer o seu trabalho pesado e ainda tem que suportar piadas de uma criança cruel e grosseira, o mesmo deve ter acontecido a esses garis e a Rede Bandeirantes não pode deixar isso assim. Demissão é o mínimo para o reacionário do Casoy.

Desculpem o desabafo.

Um comentário:

Jose Ribamar Pereira Filho disse...

Nem precisa citar o quão vergonhoso é para a nossa mídia televisiva um episódio deprimente quanto esse. À parte das discordâncias referente ao carater ou atitides anteriores de Boris Casoy, é inegável que ele representa, ou representava até o acontecido, um icone do jornalismo da TV Brasileira e acreditar numa postura passiva e impune a esse ato, no mínimo, constrangedor ao jornalismo sério é aceitar que a redemocratização e a busca pela construção de uma sociedade justa e igualitária está longe de ser alcançada.

ISSO É UMA VERGONHA!!!

Senhor Sidnei parabenizo pelo excelente texto e a exposição de sua crítica sintetiza dominío e precisão da sua escrita.