terça-feira, 3 de novembro de 2009

Heróis Sem Reconhecimento


Procure pelos seguintes nomes no Google e terá os seguintes números aproximados de citações:

Harald Edelstam - 58300/Oskar Schindler - 387000/Paul Rusebagina - 75600
Augusto Pinochet - 3.610.000/ Adolph Hitler 7.280.000/Joseph Stalin - 14.600.000

O que diferencia os primeiros dos segundos? Bom, a diferença é que enquanto os primeiros se preocuparam em salvar milhares de vidas os segundos foram responsáveis pela morte de milhões de pessoas. Sei que estou sendo simplista e que vários fatores influenciam para que o nome de Pinochet e os demais tenham mais audiência, inclusive o fato de terem sido lideres de nações, o que me estranha é que os que poderiam ser considerados heróis só recebam nota de rodapé na história. Mesmo Schindler que foi personagem de um filme de Spielberg e que participou de uma parte bem mais conhecida e divulgada da história é pouco comentado, talvez para não ofuscar os americanos, vencedores da 2ª Guerra Mundial, “salvadores do mundo”.
Por falar em americanos seria bom falar desse primeiro nome citado, Harald Edelstam era embaixador sueco no Chile quando o exército chileno apoiado pelos yankees, ”grandes defensores da democracia” (outra vez entre aspas), atacaram o Palácio do governo, provocando o suicídio do então presidente, Salvador Allende e colocando Pinochet no poder. Durante a ditadura de Pinochet cerca de 3200 pessoas desapareceram. Edelstam conseguiu salvar mais de 1300 pessoas das mãos sanguinárias do exercito chileno antes de ser expulso do país e ainda denunciou para a imprensa estrangeira toda a barbárie que estava acontecendo, já que a imprensa local apoiava o golpe e escondia que oposicionistas e colaboradores de Allende estavam sendo exterminados em massa no Estádio Nacional do Chile. Harald encarou o exército e deu a cara à tapa, salvando inclusive a embaixada de Cuba de ser atacada pelos golpistas. Um filme sobre ele acaba de ser lançado, intitulado “O Cavaleiro Negro”, mas por não ser uma produção Hollywoodiana com atores conhecidos ninguém espere um grande lançamento por aqui, por enquanto só passou em festivais e como já tem mais de um ano dificilmente será lançado no circuito comercial, talvez seja lançado em DVD mas enquanto isso basta procurar pela internet que tem para download com legendas em português.

O ultimo de nossa lista é Paul Rusebagina, gerente de hotel de luxo em Ruanda quando começou o massacre aos membros da etnia Tutsi pelos Hutus. Havia tempos as tensões estavam à flor da pele no país até que em 1994 os Hutus, etnia majoritária do país resolveram atacar, sobre incentivo de radialistas e de membros do governo pegaram em facões, paus e tudo que pudesse servir como arma e saíram a matar vizinhos, amigos, colegas de trabalho e até parentes que pertenciam a outras etnias. Não foi uma luta entre tribos isoladas como nos faziam acreditar os jornais da época, envolveu religiosos, políticos, profissionais liberais e praticamente toda a população tanto do lado das vitimas quanto dos assassinos. E Paul, que pertencia à etnia majoritária Hutu aproveitando da ausência de seus patrões e de hóspedes no hotel alojou 1200 pessoas da etnia perseguida no hotel e fazendo subornos aos lideres dos massacres e outras artimanhas conseguiu esconde-los e escoltá-los para um campo de refugiados. Só 10 anos depois o mundo parou para prestar atenção ao episódio com o filme “Hotel Ruanda” com Don Cheadle como Paul e Sophie Okonedo como sua esposa, ambos indicados ao Oscar de ator e atriz coadjuvante respectivamente. Além do filme recomendo a leitura dos livros “Gostaríamos de informá-lo que amanha seremos mortos com nossas famílias” de Philip Gourevich, editora companhia de bolso e “Sobrevivi para Contar” de Imaculee Ilibagiza, editora Fontanar. O primeiro é de um jornalista americano que visitou o país dois anos após o evento para entrevistar sobreviventes e o segundo foi escrito por uma sobrevivente que relata como sobreviveu junto com outras sete mulheres escondidas em um banheiro minúsculo na casa de um pastor. É interessante ler os dois para conhecer a história sob pontos de vista diferentes.

Paul, Oskar e Harald são pessoas que como diz a tagline de “Cavaleiro Negro”, fizeram a diferença, poderiam ter lavado as mãos e fingido que nada estava acontecendo. Paul se quisesse poderia ter escondido apenas sua esposa que era Tutsi e sua família no hotel, correria menos riscos e se brincar ainda seria considerado herói. Poderia também ter se unido a turba que clamava pelo sangue inocente e arrancado milhares de cabeças de tutsis. Edelstein não precisaria nem tomar conhecimento das execuções que aconteciam no estádio chileno, como fizeram outros embaixadores poderia continuar fazendo suas recepções e até ter sido amigo do Coronel Pinochet. O famoso Schindler a principio era apenas mais um empresário aproveitando da mão de obra barata dos judeus para enriquecer facilmente, poderia ter continuado assim e ficar indiferente ao destino dos que trabalharam para ele como fizeram vários magnatas da época. Mas parece que o destino se propõe a pregar peças e revelar os verdadeiros salvadores, pessoas de carne e osso que se viram forçados a agir em situação adversa. Seria por um grande sentimento humanitário? Ou será que receberam um chamado divino como Moisés ao ver a sarça ardente no deserto?Talvez queriam entrar para história ou puro e simples remorso. Não importa o motivo a humanidade agradece e sem medo de ser piegas plageia Spielberg no final de “A Lista de Schindler” atestando que quem salva uma vida, salva o mundo inteiro.

Curiosidade: O golpe chileno ocorreu no dia 11 de Setembro de 1973, no filme 11 de setembro em que 11 diretores do mundo inteiro apresentam sua visão sobre os atentados ao World Trade Center o diretor inglês Ken Loach em seu episódio mostra um chileno exilado mandando uma carta para os norte-americanos em que faz um paralelo entre os dois acontecimentos, qualquer dia comento esse filme aqui.

Quando Pinochet morreu o político brasileiro Jarbas Passarinho (um dos artífices do golpe brasileiro) comentou ao G1: “Foi um homem que, num momento azado (oportuno), salvou o Chile de ser um país marxista presidido pelo Allende, que chegou a receber Fidel Castro em Santiago com toda a pompa. Ele deixa o Chile numa situação econômica estável e invejável, cuja recuperação é fruto do seu governo.”

É para rir?

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Barriga

Não existe nada pior que "barriga", e não estou falando do resultado de seu sedentarismo, caro leitor (se é que alguém vá ler isso), estou falando do costume de roteiristas de alongar suas tramas até o limite do insuportável quando essas começam a fazer sucesso, inserem uns novos personagens ou colocam em destaque outros até então irrelevantes e destrói a paciência de quem está acompanhando novelas e seriados, quem acompanha seriados deve ter percebido que eles chegam a um ponto em que já poderiam ser encerrados, mas seus produtores continuam lançando novos fatos e situações que só servem para “encher linguiça” e interessam muito pouco. O fato é que a TV vive de dinheiro e se os produtores não possuem pudores em tirar do ar uma série com baixa audiência antes de dar um fim à trama, o mesmo se aplica a estender histórias que já não possuem mais nada a oferecer.

Temos inúmeras séries que poderiam ser listadas, mesmo o cultuado Lost vive de adicionar personagens a torto e direito e quando resolvem um mistério outros 10 são adicionados, o caso mais emblemático foi a inclusão do casal Nicky(Kiele Sanchez) e Paulo(Rodrigo Santoro) na ilha, apesar de ter mexido em nosso orgulho cívico ao colocar Santoro, um brasileiro, no cast do seriado não serviu para mais nada, ambos se mostraram sem importância e desconectados do contexto geral, talvez por terem chegado com o "bonde andando". É complicado pro telespectador estar acostumado com um grupo de pessoas e olhar para duas novas fazendo de conta que ela estavam lá o tempo todo como quiseram fazer parecer na série. Já diziam os manifestantes do Diretas Já, O povo não é bobo.

Outro caso é Prison Break, na primeira temporada temos a história de Michael Scofield (Wentworth Miller) que dá um jeito de ser preso para livrar o irmão de ir para a cadeira elétrica por um crime que não cometeu. Toda a temporada, inverossimilhanças a parte, se concentrava em seu plano de fuga e era interessante e divertido vê-lo sendo colocado em prática. Na segunda Temporada, Michael, o irmão e outros presos que ele teve que ir agregando a seu plano são mostrados percorrendo o país perseguidos pela justiça e por um cara do FBI tão astuto como o protagonista e que consegue prever muitos dos seus movimentos. Todo um clima de conspirações, perseguições e adrenalina contribuiu para que série se tornasse um sucesso, mas o mais óbvio é que depois que os irmãos conseguissem se livrar das acusações tivessem um final feliz junto com o que restou de sua família. Mas o sucesso do programa tornou obrigatória uma terceira temporada, já que tudo tinha se esgotado porque não colocar Michael na cadeia de novo? Mas trazê-lo de volta a antiga prisão não funcionaria, era fichinha, tinha que ser algo mais barra pesada. Deram então um jeito de colocá-lo junto com boa parte do elenco da temporada anterior em uma prisão de terceiro mundo, no caso o Panamá. Michael deveria ter assistido o seriado Blossom, em um episódio Joey (Joey Lawrence) comentando sobre o filme "Expresso da Meia Noite" diz que se você quer cometer um crime não pode escolher a Turquia já que lá as pessoas são más. Se ele tivesse visto saberia que isso se aplica a todos os países de terceiro mundo, pelo menos na visão dos roteiristas de cinema e televisão em Hollywood. Na nova prisão a lei não existe você tem que matar um leão por dia para sobreviver e mesmo os presos sendo deixados ao Deus dará não existe possibilidade quase nenhuma de fuga, e da- lhe repetições de situações da primeira temporada, saturação de clichês, simplesmente deixamos de nos importar com os personagens de tão previsível.

Nem as séries dramáticas escapam dessa armadilha, "A Sete Palmos", sobre uma família que cuida de uma funerária e vive seus dramas do dia-a-dia enquanto cuidam de velórios e embalsamamentos teve uma terceira temporada mais arrastada que novela e ainda inseriu uma nova personagem que era um "purgante", a insuportável Lisa (Lili Taylor).

Também é importante saber que isso não é fato recente já que na década de 70 adicionaram um personagem chamado Primo Oliver em uma série de sucesso para poder ter mais argumentos. Erro fatal, pois caiu a audiência e o seriado foi cancelado. Daí em diante "Cousin Oliver" passou a ser referência de personagem adicionado no meio da história. Ainda tivemos Dallas, série famosa dos anos 80 e que vivia ressuscitando personagens e adicionando novos à medida que a audiência oscilava, tiveram a audácia de transformar uma temporada inteira em sonho de uma personagem só para justificar o retorno do marido dela que tinha morrido na temporada anterior. E por fim a ótima série Twin Peaks de 1989, que tinha como mote a pergunta "Quem Matou Laura Palmer?". Resolvido esse mistério algum gênio achou por bem estende-la já que fazia muito sucesso, só que o criador da série, David Lynch, se afastou para dirigir um filme e os novos diretores e roteiristas acharam que transformar tudo em uma chanchada sem pé nem cabeça bastaria para segurar os telespectadores, basta dizer que o triângulo amoroso cômico entre a recepcionista da delegacia, um guarda e um atendente de loja passou a ser uma das principais tramas da série. Como era de se prever, a audiência caiu e quando Lynch retornou, o estrago era muito grande para ser consertado. Dizem que inclusive alguns dos atores se recusaram a participar no filme que servia de prequel a série exatamente pelo descaso do diretor com sua obra.

Claro que certa irregularidade em séries é normal pelo fato de ter diferentes diretores e roteiristas trabalhando em cada episódio, o problema é quando a série se desestrutura e deixa de ficar interessante, pior ainda quando perde o foco de seu eixo principal, muitas vezes chega ao final apenas um fiapo do que a série prometia, e pro telespectador fica aquela incerteza, se a série não fizer sucesso corre o risco de cancelarem antes de qualquer solução dos mistérios e se do contrário fizer muito sucesso podem começar a enrolar até tirar a vontade de ligar a TV no horário para ver os próximos episódios.

sábado, 15 de agosto de 2009

Arraste-me Para o Inferno e um pouco de corporativismo.

Sam Reimi, diretor da trilogia (até o momento, já que estão planejando o 4º filme) Homem Aranha, lançou em 1982 "A Morte do Demônio” * (Evil Dead) um marco do cinema de terror que está na lista dos melhores de qualquer fã do gênero, mesmo entre os mais exigentes. Pois foi uma grata surpresa descobrir que ele havia resolvido voltar ao gênero que o revelou, mesmo ficando com medo de que sua experiência com blockbuster o tivesse deixado muito apegado ao CGI e pirotecnias técnicas e o retorno ao terror pudesse nos trazer uma “bomba”. Felizmente eu estava errado, Arraste-me Para o inferno (Drag me to Hell, 2009) é uma pequena pérola e provavelmente um dos melhores filmes de terror que vi esse ano, parecia que tinha voltado aos anos 80, um filme cheio de sangue e escatologia e que não poupa a protagonista de passar pelas maiores agruras durante toda sua execução, coisas simples como ir ao fundo de um tumulo cheio de água junto a um defunto. Alison Lohman é Chris, uma funcionária de banco que para mostrar ao seu gerente que merece uma promoção recusa estender a dívida de Sylvia Ganush, uma velhinha que está para ser despejada, a idosa, insatisfeitae se sentindo humilhada, joga uma maldição na garota que começa a ser perseguida por um demônio, a pobre moça passa então a correr contra o tempo já que o coisa-ruim irá arrastá-la para o inferno em 3 dias se o feitiço não for desfeito. Reimi nos brinda com cenas de fazer os mais fracos dormirem com a luz ligada e os de estomago frágil devolverem todo o fast-food que serviu de refeição antes da seção. Claro que o filme não se resume a um amontoado de cenas toscas e nojentas, tem um clima tenso, atuações boas e para quem gosta de conteúdo tem até uma critica sutil a competição nas empresas, a ambição desmedida e a recente crise imobiliária. Eu que já estou calejado com filmes de terror passei alguns sustos de verdade na sala de cinema, prova que Reimi não perdeu a mão e sabe que mesmo nesses tempos de internet, nada mais eficaz que um bom horror a moda antiga com efeitos digitais discretos, maquiagens grotescas, cenas de embrulhar o estomago e uma piadinha aqui e ali para quebrar o clima. O Bom elenco é composto por além de Alison, que não tem nenhum trabalho conhecido em fitas de horror mas já trabalhou com diretores como Robert Zemeckis, Tim Burton e Ridley Scott, Justin Long que trabalhou nos dois filmes “Olhos Famintos” como o namorado de Chris, que a apóia mas tenta convencê-la de que isso tudo não é real.Temos ainda Lorna Raver, atriz basicamente de TV como a assustadora Sylvia Ganush. Adriana Barraza, atriz mexicana indicada ao Oscar por Babel de Alejandro Gonzáles Inãrrítu e que trabalhou também em “Amores Brutos” do mesmo diretor aqui faz uma vidente que tenta ajudar a mocinha e Reggie Lee, vilão da segunda temporada da série “Prison Break, é o colega de trabalho de Chris que não se importa em jogar sujo para conquistar a promoção no lugar dela. Mas e o corporativismo do titulo? Pois é, é que como a protagonista do filme também sou bancário e faz muito tempo percebi que nossa classe nunca é muito bem vista em filmes e outras obras, médicos, jornalistas, operários, lavradores e até advogados já tiveram suas oportunidades tanto como vilões quanto como mocinhos, antes da personagem de Alisson Lohman em “Arraste-me Para o Inferno”, o único herói que conheço que trabalhe em banco é Stanley Ipkiss (Jim Carrey) de "O Máscara" e ele pode ser considerado mais um anti-herói. No geral bancários são mostrados como pessoas insensíveis, burocráticas e fracassadas que escolheu essa profissão por pura falta de opções. Se as intempéries de Chris em "Arraste-me Para o Inferno" mostra um pouco de como é o ambiente em instituições financeiras talvez também sirva como vingança para muitos telespectadores que já sofreram em uma fila de banco. A classe dos bancários sofre por representar uma instituição muito mal vista, enquanto os banqueiros, donos do dinheiro e do poder são resguardados em suas salas de mármore e vidro, funcionários do baixo escalão agüentam baixo salário (um funcionário em inicio de carreira ganha na faixa de R$ 1000/mês, os maiores bancos brasileiros costumam ter lucros de bilhões de reais por semestre), metas abusivas, doenças ocupacionais, necessidade de empurrar seguro, previdência e capitalização para clientes já endividados e insatisfeitos com o atendimento, plano de carreira ruim, stress, falta de tempo para se preparar para coisas melhores e ainda servem de portadores de más noticias para o cliente (seu limite estourou, seu cartão está bloqueado, seu crédito não foi aprovado). Só para encerrar quero deixar claro que não estou aqui levantando bandeira, não vou começar a fazer abaixo assinado para que os bancários sejam bem vistos em filme até porque sei que mesmo que não sejam a maioria existem muitos profissionais da área que fazem jus a representação feita. Só quis fazer uma constatação e desabafar aproveitando o gancho do ótimo filme do Sam Reimi. Todos que puderem corram ao cinema o mais rápido possível para ver a obra. * O filme “The Evil Dead recebeu vários títulos por aqui, isso porque a seqüência estreou primeiro aqui no Brasil com o título de "Uma Noite Alucinante- Morto ao Amanhecer", só depois resolveram lançar o filme original nos cinemas o intitulando como “Uma Noite Alucinante – Parte 1 – Onde Tudo Começou” mas quando lançado em vídeo mudaram o nome para "A Morte do Demônio", em DVD o primeiro filme(péssima edição da LW editora, diga-se de passagem) foi lançado com o título de "The Evil Dead" e a seqüência como "Uma Noite Alucinante", o terceiro filme da franquia, Army of Darkness: Evil Dead 3 foi lançado em vídeo como Uma Noite Alucinante 2 e não tem, ainda, edição em DVD. (Com informações do site Boca do inferno.)

terça-feira, 28 de julho de 2009

Danilo Gentili e o King Kong

O CQC é um programa inteligente, apesar de alguns de seus repórteres se acharem mais importantes do que realmente são e de sempre pegarem mais leve com políticos que lhe são simpáticos, o Serra por exemplo. Mas eu reconheço que depois que o Pânico entrou na pasmaceira estava faltando um programa de humor que me fizesse parar para assistir. O problema é que o programa começa a demonstrar visíveis sinais de cansaço, o quadro “Denuncie Já”, por exemplo, esses dias mostrou um bando de riquinhos reclamando do barulho de cachorros em sua rua, pareceu reportagem do Aqui Agora, alguns repórteres estão precisando renovar o estoque de piadas e o Gentili que eu só gostava no inicio se mostra arrogante e antipático em suas reportagens sem a leveza e a veia cômica do Rafael Cortez por exemplo.

Para piorar, o mesmo Danilo Gentili conseguiu uma façanha em seu Twitter esses dias. Depois de postar o seguinte comentário:

“Agora no TeleCine KingKong, um macaco q depois q vai p/ cidade e fica famoso pega 1 loira. Quem ele acha q e? Jogador de futebol?”

Alguns de seus “seguidores” acharam a frase racista e reclamaram, talvez não fosse para tanto, o problema foram as réplicas do humorista, depois de se sentir acuado ele tentou justificar o injustificável com a seguinte perola

“Alguém pode me dar 1 explicacao razoavel pq posso chamar gay de veado, gordo de baleia, branco de lagartixa mas nunca um negro de macaco”

Ou seja, reconheceu que costumava utilizar expressões pejorativas para um monte de minorias e que só os negros se ofendem, como se a pessoa que se ofende é que estivesse errada, depois ainda tentou consertar dizendo que não se referiu à cor do jogador quando postou a piada. Tudo bem, mas depois dessa frase anterior já não tinha mais como voltar atrás. Deveria ter ficado calado que ganharia mais.

E não parou por aí, escreveu um texto no seu blog que é um festival de lugares comuns racistas, parece até produto de um desses sites de direita reacionária. As partes em itálico são dele, o restante são meus comentários:

As pessoas que separam cachorros por raças fazem isso porque acreditam que uma raça vale mais que a outra. Eles acreditam mesmo nisso. Ganham dinheiro com isso. Movimentam um mercado. Dividir uma espécie por raças nada mais é do que racismo.

Ok. Por enquanto estamos falando de animais, se repararem existem muitas diferenças entre um Poodle e um Pitbull, não só na aparência física como no comportamento. Existem pessoas que se sentem melhor tendo um animal mais calmo em casa enquanto outras preferem um cachorro de caça, cada um irá pagar o preço que ele acha que vale o animal que quer comprar. O mesmo ocorre com cavalos, alguns são melhores para corrida, outros para puxar carga, o que define seu preço é a demanda de mercado mas o que define sua utilidade é seu porte físico e instinto. Mas ele ainda não demonstrou aonde quer chegar com isso.
Sinceramente acredito que todo cachorro é cachorro e que toda pessoa é pessoa. E dentro disso não entendo como alguém que morde seu sapato, encoxa sua perna e caga no seu tapete pode ser considerado o melhor amigo do homem.

Todo cachorro é cachorro, mas existem raças diferentes. E um cachorro só vai fazer esse tipo de coisa se tiver um dono relapso e que lhe dê abertura para cagar no tapete, não que isso importe ao assunto comentado.
Se você me disser que é da raça negra preciso dizer que você também é racista, pois, assim como os criadores de cachorros, acredita que somos separados por raças. E se acredita nisso vai ter que confessar que uma raça é melhor ou pior que a outra. Pois se todas raças são iguais então a divisão por raça é estúpida e desnecessária. Pra que perder tempo separando algo se no fundo dá tudo no mesmo?

Como diria Januário de Oliveira: Taí o que você queria. É aqui que ele começa a defender a tese de que negros são racistas e trabalha o que um professor meu gosta de definir como Culpabilização da Vítima, ou seja imputar a quem sofre o preconceito a culpa pelo seu martírio. Desde quando ser diferente é ser melhor ou pior? As pessoas possuem características diferentes mesmo dentro de uma mesma raça mas isso não faz de uma pessoa melhor que outra. Para definir diferenças existe a classificação por sexo, raça, orientação sexual e é necessária para estudos que, por exemplo, tratem doenças que são mais comuns em uma raça que em outras, mais comuns a pessoas do sexo feminino que a pessoas do sexo masculino. Ninguém nunca pregou que se deve fechar os olhos as diferenças, pois elas existem, mas apenas defendendo que apesar das diferenças todos possuem os mesmos direitos.
Quem propagou a idéia que "negro" é uma raça foram os escravistas. Eles usaram isso como desculpa para vender os pretos como escravos: "Podemos tratá-los como animais, afinal eles são de uma outra raça que não é a nossa. Eles são da raça negra". Então quando vejo um cara dizendo que tem orgulho em ser da raça negra eu juro que nem me passa pela cabeça chama-lo de macaco. E sim de burro.
O velho argumento de quem quer justificar o preconceito que brada que quem tem orgulho de ser gay ou negro está tentando se colocar um patamar acima dos outros. Orgulho nesse caso vem na contramão de vergonha, enquanto muitos gays simplesmente escondem suas preferências sexuais por medo uma pessoa que diz ter orgulho gay está querendo mostrar que conhece seus direitos e que não aceita ser ofendida por suas escolhas. O mesmo ocorre com os negros, que até hoje são minoria em grandes empresas e são olhados atravessados quando entram em ônibus. Mas claro que o senhor Gentili prefere fingir não saber disso.

Falando em burro, cresci ouvindo que eu sou uma girafa. E também cresci chamando um dos meus melhores amigos de elefante. Já ouvi muita gente chamar loira caucasiana de burra, gay de viado e ruivo de salsicha, que nada mais é do que ser chamado de restos de porco e boi misturados.

Uau... Pobre coitado. Deve ter sido isolado do resto das crianças por ser alto. Aposto que foi isso que impediu que ele fizesse faculdade, deve ter sido perseguido na rua e proibido de comungar na igreja. Como ele queria ser baixinho como os outros colegas para poder ser aceito.
Mas se alguém chama um preto de macaco é crucificado. E isso pra mim não faz sentido. Qual o preconceito com o macaco? Imagina no zoológico como o macaco não deve se sentir triste quando ouve os outros animais comentando:- O macaco é o pior de todos. Quando um humano se xinga de burro ou elefante dão risada. Mas quando xingam de macaco vão presos. Ser macaco é uma coisa terrível. Graças a Deus não somos macacos.

Preguiça de comentar isso. É muito difícil entender que não estamos falando de brincadeiras entre crianças de colégio? Estamos falando de uma pessoa publica que deveria tomar mais cuidado com as coisas que fala, um “formador de opinião”, que não entende que muitas pessoas levam a sério e replicam o que ele diz. Os macacos são irracionais e como tal não têm como se sentir ofendidos.

Prefiro ser chamado de macaco do que de girafa. Peça para um cientista fazer um teste de Q.I. com uma girafa e com um macaco. Veja quem tira a maior nota.

Se ele não se ofende, ótimo. Mas um gay tem o direito de se sentir ofendido quando o xingam de viado assim como o negro tem o direito de se sentir ofendido quando o chamam de um animal que é considerado uma etapa inferior da evolução humana.
Quando queremos muito ofender e atacar alguém, por motivos desconhecidos, não xingamos diretamente a pessoa e sim a mãe dela. Posso afirmar aqui então que Darwin foi o maior racista da história por dizer que eu vim do macaco?

Qual é a relação de uma coisa com a outra? Primeiro que Darwin disse apenas que o homem e o macaco vieram de um ancestral comum e não entendi onde a mãe entra nessa história.
Se o assunto é cor eu defendo a idéia que o mundo é uma caixa de lápis coloridos. Somos os lápis dessa caixa. Um lápis é menos lápis que o outro só porque a cor é diferente? Eu desenho desde criança, então acredite em mim: Não mesmo. Todas essas cores são de igual importância. Ok. Ok. Foi uma comparação idiota. Confesso. Os lápis são todos do mesmo tamanho na caixa. E no mundo real o lápis preto é bem maior que o amarelo.

Realmente foi uma comparação idiota. Seria uma metáfora bonitinha para um garoto de quinta série mas o repórter conseguiria algo melhor que isso.
Mas o que quero dizer é que na verdade não sei qual o problema em chamar um preto de preto. Esse é o nome da cor não é? Eu sou um ser humano da cor branca. O japonês da cor amarela. O índio da cor vermelha. O africano da cor preta. Se querem igualdade deveriam assumir o termo "preto" pois esse é o nome da cor. Não fica destoante isso: "Branco, Amarelo, Vermelho, Negro"?. O Darth Vader pra mim é negro. Mas o Bill Cosby(SIC), Richard Pryor e Eddie Murphy que inspiram meu trabalho não. Mas se gostam tanto assim do termo negro, ok, eu uso, não vejo problemas. No fim das contas é só uma palavra. E embora o dicionário seja um dos livros mais vendidos do mundo, penso que palavras não definem muitas coisas e sim atitudes.

Uma rosa teria o mesmo aroma se tivesse outro nome? Não é bem esse o caso, preto sempre foi utilizado de forma pejorativa, a raça é negra pois existem diferentes nuances nas cores das pessoas dessa raça, nem todas são da cor preta. E qual o sentido de se chamar alguém pela sua cor, todas as pessoas foram batizadas e receberam um nome, elas não se definem pelas cores que possuem.
Digo isso porque a patrulha do politicamente correto é tão imbecil e superficial que tenho absoluta certeza que serei censurado se um dia escutarem eu dizer: "E aí seu PRETO, senta aqui e toma uma comigo!". Porém, se eu usar o tom correto e a postura certa ao dizer "Desculpe meu querido, mas já que é um afro-descendente é melhor evitar sentar aqui. Mas eu arrumo uma outra mesa muito mais bonita pra você!" sei que receberei elogios dessas mesmas pessoas, afinal eu usei os termos politicamentes corretos e não a palavra "preto" ou "macaco", que são palavras tão horríveis.

Claro que a luta pela inclusão social é imbecil e superficial, é feito por pessoas ignorantes que não entendem que o preconceito não existe, que os negros têm oportunidades iguais e que a democracia racial domina em terras brasileiras. Pobres brancos que não podem nem fazer brincadeiras com seus irmãos pretos. Como esses negros são mal agradecidos, os brancos dão a oportunidade de que esses convivam com eles e esses reclamam da contrapartida que é aceitar todas as piadas e gozações que fazem com eles.

Os politicamentes corretos acham que são como o Superman, o cara dotado de dons superiores, que vai defender os fracos, oprimidos e impotentes. E acredite. Isso é racismo, pois transmite a idéia de superioridade que essas pessoas sentem de si em relação aos seus "defendidos".

Quer dizer que para se sentir mal com o preconceito a pessoa tem que ser atingida por ele ou estará apenas querendo mostrar superioridade? Todos os brancos que lutaram contra a escravidão, todos os heteros que defendem os direitos dos homossexuais, todos os homens que não compartilham de uma visão machista nada mais são que pessoas que reafirmam o preconceito, pois defendem os direitos das minorias para se sentir superior. Genial, como eu não tinha pensando nisso ainda.
Agora peço que não sejam racistas comigo por favor. Nao é só porque eu sou branco que eu escravizei um preto. Eu juro que nunca fiz nada parecido com isso nem mesmo em pensamento. Não tenham esse preconceito comigo. Na verdade sou ítalo-descente. Italianos não escravizaram africanos no Brasil. Vieram pra cá e assim como os pretos trabalharam na lavoura. A diferença é que Escrava Isaura fez mais sucesso que Terra Nostra.

Ítalo-descendente. Que chique! Interessante ele citar isso já que todos sabem que os europeus vieram trabalhar no Brasil dentro de uma campanha de branqueamento da população e que sua chegada relegou aos negros trabalhos ainda menos dignos que os que faziam durante a escravidão. Não que isso seja culpa dos italianos, mas essa comparação foi no mínimo absurda.
Ok. O que acabei de dizer foi uma piada de mal gosto porque eu não disse nela como os pretos sofreram mais que os italianos. Ok. Eu sei que os negros sofreram mais que qualquer raça no Brasil. Foram chicoteados. Torturados. Foi algo tão desumano que só um ser humano seria capaz de fazer igual. Brancos caçaram negros como animais. Mas também os compraram de outros negros. Sim. Ser dono de escravo nunca foi privilégio caucasiano e sim da sociedade dominante. Na África, uma tribo vencedora escravizava a outra e as vendia para os brancos sujos.

De mau (mau com u) gosto é todo esse texto, que apenas replica um monte de argumentos racistas encontrados na internet, dêem uma caçada no Google e verão milhares de textos parecidos com esse do Danilo, o velho argumento batido de que os negros vendiam escravos parece justificar a escravidão e não lembra que os próprios brancos incentivavam as guerras entre tribos. Ninguém nunca disse que a África era o paraíso perdido, eles tinham suas guerras como todo o mundo dito civilizado e vendiam como escravos os presos de guerra mas não entendo como isso justifica o tráfico escravo. Ah, eles vendiam então temos que comprar e trazer os negros em navios negreiros abarrotados, e espanca-los e obriga-los a trabalhar de forma desumana.
Lembra que eu disse que era ítalo-descendente? Então. Os italianos podem nunca terem escravizados os pretos, mas os romanos escravizaram os judeus. E eles já se vingaram de mim com juros e correção monetária, pois já fui escravo durante anos de um carnê das Casas Bahia.

Os italianos tiveram colônias na África também e não acredito que o tratamento aos negros dessas nações coloniais fosse muito diferente da que era dado aos escravos e a Somália, um dos países mais pobres do mundo provavelmente teve ajuda de seus colonizadores italianos para chegar nessa situação. O problema maior é que o antigo "repórter inexperiente" se nega como sujeito da história, toda a realidade dos negros e brancos brasileiros resulta da história da escravidão no país e por mais que os brancos tentem negar isso a mudança não ocorre de um dia para o outro. A escravidão ainda é um fato recente, historicamente falando, só lembrarmos que ainda existem em 2009 filhos de escravos ainda vivos e com certeza a forma como vivem hoje é resultado desse processo histórico, é algo muito mais presente hoje em dia que a história clássica onde se insere o Império Romano, por ele citado.
Se é engraçado piada de gay e gordo, porque não é a de preto? Porque foram escravos no passado hoje são café-com-leite no mundo do humor? É isso? Eu posso fazer a piada com gay só porque seus ancestrais nunca foram escravos? Pense bem, talvez o gay na infância também tenha sofrido abusos de alguém mais velho com o chicote.

Por mim o Danilo pode fazer a piada que quiser de quem quiser, se ele é tão limitado a ponto de seu repertorio só contemplar estereótipos só posso lamentar por ele, o que não se deve admitir é que a pessoa tente se justificar reafirmando preconceitos arraigados por essa sociedade hipócrita e preconceituosa. Só gays, mulheres, negros, índios, gordos e as vitimas de preconceitos em geral sabem o quanto sofrem com a baixa auto-estima provocada por esse tipo de comentários inadequados.
Se você acha que vai impor respeito me obrigando a usar o termo "negro" ou "afro-descendente", tudo bem, eu posso fazer isso só pra agradar. Na minha cabeça você será apenas preto e eu branco, da mesma raça, a raça humana. E você nunca me verá por aí com uma camiseta escrita "100% humano", pois não tenho orgulho nenhum de ser dessa raça que discute coisas idiotas de uma forma superficial e discrimina o próprio irmão.

Superficial é dizer que o preconceito não existe só porque brancos bebem cerveja com negros. Quando chegar a uma universidade ou numa empresa conte o número de negros e poderá tirar suas conclusões.
OBS: Antes que diga "Não devemos fazer piadas com negros, nem com gordos, nem com gays, nem com ninguém" Te digo: "Pode colocar meu nome aí nas páginas brancas da sua lista negra, mas te acho chato pra caralho".

É muito fácil transformar alguém em chacota fazendo piadas sobre sua aparência ou sua cor ou sua sexualidade quando não se é o alvo da anedota. Prefiro ser um chato a me auto afirmar humilhando os outros para chamar a atenção.


Por mais que tentemos esconder, disfarçar, a realidade nos esbofeteia o tempo todo, o Brasil é um país cheio de preconceitos, uma senhora angolana esses dias passou constrangimento em um guichê enquanto trocava dinheiro em uma casa de cambio quando a mulher que estava a sua frente pensou que ela iria assaltá-la só por ter tocado em sua bolsa por acidente, o Richarlyson, jogador do São Paulo vive recebendo apelidos homo fóbicos da torcida durante os jogos e casos aparecem sempre na mídia de pessoas que consideram que sua cor caucasiana tem uma importância maior. E pessoas públicas, formadores de opinião não devem incentivar esse tipo de coisa. O Danilo foi infeliz não quando escreveu a primeira frase que de cara parecia ser algo inocente, mas ao contra atacar com argumentos racistas.

Por fim me utilizo de uma frase do Helio de La Pena que comentou sobre a polêmica:
“O direito a defesa da própria vida, e no caso dos seres humanos, sua vida psicologica que se expressa no respeito a sua dignidade, é o mais básico de todos. Se você acha que nem isto estas pessoas podem fazer, devendo aceitar com resignação o lugar social do qual jamais deverão sair, então talvez você concorde que existe uma hierarquia de "humanidades" onde os considerados de menos valor, podem e devem mesmo ser destruidos fisica e simbolicamente.”
O Casseta e Planeta do qual o Helio faz parte realmente está decadente mas ele pelo menos soube demonstrar melhor entendimento da situação que o Danilo.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Inocência Roubada

Elissa Wall cresceu como membro da Igreja Fundamentalista de Jesus Cristo dos Últimos Dias(IFSUD), uma dissidência da Igreja Mormon. Diferente dos Mormons e da maioria das religiões ocidentais a IFSUD aceita o poligamismo e nesse livro a autora nos dá um relato instigante sobre como foi sua vida nessa igreja, desde a infancia feliz junto ao pai e suas esposas até ser obrigada com apenas 14 anos a se casar com o líder da seita, fato que foi uma reviravolta em sua vida já que com muito pouca idade ela teve que se submeter a um marido tirano que abusava dela e das outras esposas como se fossem todas de sua propriedade, ela então tem que lutar contra suas tradições para conseguir sua liberdade. O enredo parece banal, certo? Mas o texto é instigante e bem acessível e é isso que faz a diferença, Seria muito fácil recorrer ao pieguismo e autocomiseração mas a autora não cai na superficiliade evitando um relato cheio de ressentimentos ao por exemplo isentar-se de fazer julgamentos das práticas poligamicas dos demais membros da religião como seu pai e avô. É um livro recomendável por trazer a baila discussões importantes como o machismo, diferença entre religião e seita e ainda por nos fazer conhecer uma cultura diferente da nossa.
Quem quiser saber mais e ler o primeiro capítulo só visitar o site:

Inocência Roubada - Elissa Wall - São Paulo - Ediouro 2009.

domingo, 29 de março de 2009

Invasão Persa

Muito se tem falado da cinematografia da Índia por causa da novela "Caminhos da Índia" e pelo filme ganhador do Oscar "Quem Quer Ser um Milionário", mas eu resolvi comentar sobre a cinematografia de um país que já esteve bastante em voga aqui no Brasil e agora deu uma sumida, no caso o Irã, cujos filmes são obras-primas para alguns e soníferos para outros. Por sorte só mais recentemente tenho tido oportunidade de ver alguns filmes iranianos depois que passou a onda de crianças e mulheres de xador nos cinemas brasileiros, pois eu tenho a convicção que com um maior distanciamento dá para ter uma visão mais independente.

Zapeando pela TV esses dias acabei passando pela TV Futura que transmitia o iraniano "O Voto é Secreto", nesse filme uma espécie de mesária itinerante sai por uma determinada região do país recolhendo votos pra eleição iraniana e se depara com várias dificuldades, entre elas a descrença da população com a política, a ignorância e ainda o preconceito contra sua condição de mulher em uma sociedade muçulmana. O filme, assim como a maioria das películas daquele país é contemplativo, trabalha muito com figuras de linguagem e não se preocupa com agilidade, talvez por esse motivo a platéia ocidental totalmente viciada em filmes com estética de videoclipe venha a penar um pouco ao acompanhar a saga da moça percorrendo uma vila remota com sua urna eleitoral, mas pode ter certeza que ninguém sai indiferente ao filme, não tem final surpresa, redenção, nada desses apelos Hollywoodianos, apenas uma câmera seguindo personagens realistas, de forma quase documental, sem se envolver e sem manipular a platéia e dando uma lição de humanidade.

Toda a cinematografia do Irã tem esse tom que lembra o neo-realismo, época em que a Itália do pós guerra tentava juntar os cacos e produziu filmes como "Ladrões de Bicicletas" de Vittorio de Sicca em que denunciavam a falta de oportunidades e a marginalização dos pobres, com pouco dinheiro e atores não profissionais selecionados entre a própria população. Da mesma forma, ainda que com sutilezas os cineastas iranianos conseguem criticar as convenções a que estão expostas a população pobre de seu país, machismo, pobreza, alienação, falta de oportunidades, anacronismo da sociedade, preconceito contra minorias. Em Filhos do Paraíso, filme mais conhecido da região, indicado ao Oscar e exibido de vez em quando nas madrugadas da Rede Globo, temos as crianças que precisam correr por um sapato, em "A Cor do Paraíso nos emocionamos com a saga do garoto cego, que é super esperto e sensível mas passa a ser um problema pro pai que quer se casar outra vez, no seguimento Iraniano do filme em episódios "11 de Setembro", uma professora tenta explicar aos seus alunos sobre o desabamento de um prédio do outro lado do mundo quando alguns nem sabem o que significa a palavra prédio, são vários os problemas que aos olhos ocidentais podem parecer ingênuos ou simples de resolver mas que pode ser uma tragédia para pessoas que vivem em condições precárias, se eu tivesse um jarro e ele quebrasse eu simplesmente iria ao mercado e compraria outro mas pense um grupo de crianças no deserto que precisam desse jarro para colocar a água que bebem na escola. Alguns desses cineastas ousam tocar até mesmo em temas tabus na sociedade islâmica, claro que não é de forma direta, precisam de metáforas e quem vê seus filmes necessita de uma visão um pouco mais apurada e imaginação para compreender seus jogos. Por Exemplo, em "Gosto de Cereja", um homem passa o filme todo procurando por alguém que o ajude a cometer suicídio, muitos críticos aventaram a hipótese de que ele fosse homossexual, mas o diretor desse filme nunca confirmou a informação e nada no filme pode dar a certeza disso. Em "O Voto é Secreto" no final temos a impressão que o soldado se apaixonou pela garota responsável pelo recolhimento dos votos, mas pode ser só uma impressão, ou não.

Por mais que essas realidades pareçam por demais distantes dá pra fazer uma analogia com a nossa, quantos no nosso país não vivem abaixo da linha de pobreza? Quantos por esses rincões nunca tiveram acesso e talvez nem tenham a coisas simples para nós da cidade como uma televisão ou mesmo comida? Se o machismo fosse coisa do passado a Lei Maria da Penha precisaria existir? Pegando "O Voto É Secreto" especificamente e trazendo pra nossa realidade é de se raciocinar quanto esse país não está contaminado por uma falsa ou equivocada noção de democracia, um país onde o coronelismo, se não é ainda tão forte, ainda não acabou. Onde muitos ainda trocam o voto por um chapéu ou um par de botinas. Então vamos assistir aos filmes que vieram do outro lado do mundo e antes de julgar, condenar ou menosprezar a realidade daquele povo vamos ver o quanto não temos que fazer de faxina em nossa própria casa.

Filmes que vi:

Como essa semana que passou eu vi um monte de filmes e fiquei com vontade de escrever sobre eles, resolvi fazer um resumão como costumava fazer no inicio desse blog.

Velocidad Funda al Olvido - Filme argentino, mais um que aparentemente procura passar a limpo os tempos da ditadura, não é ruim, mas às vezes um pouco confuso, nem sempre ele deixa claro qual caminho quer seguir e o protagonista não tem empatia suficiente, diferente da personagem da garota espanhola que o ajuda em sua via-crúcis a procura de sua mãe na Espanha, ela consegue roubar a maioria das cenas.

Dia dos Namorados Macabros 3D- A Tecnologia 3D é interessante, mas só isso não resolverá a fuga do público do cinema, ou investem em bons roteiros ou o 3D será apenas um paliativo de efeito curto, vale lembrar que esse efeito já tinha sido usado de forma mais precária nas décadas de 50 e 80 e parece gostar de ressurgir de tempos em tempos como o Jason( que aliás também teve seu filme 3D em Sexta Feira 13 parte 3). Revi também o Dia dos Namorados Macabro original de 1981, é um dos bons produtos slasher da época. A história? Alguém se importa?

Motivos Para no Enamorar-se - Outro filme argentino, estava tendo uma mostra no Espaço HSBC em São Paulo, garota com problemas em se relacionar com os homens se envolve com cara com mais que o dobro de sua idade, nossos hermanos mostram que sabem fazer uma boa comédia romântica, é um filme leve e divertido mas não é raso como um filme da Meg Ryan.

Quem Quer Ser um Milionário? - Esse todo mundo sabe qual é, o ganhador do Oscar desse ano, uma celebração do cinema de Bollywood, dirigido pelo moderninho e eclético (vou usar essa palavra mesmo não gostando dela) Danny Boyle, diferente da maioria eu gosto das obras Hollywoodianas do Boyle, “A Praia” não é o lixo todo que pregam e “Por Uma Vida Menos Ordinária” é um filme bem divertido, mas reconheço que ficam bem aquém dos geniais “Trainspotting” e “Cova Rasa” seus filmes anglicanos mais famosos e foi só ele volta a filmar na Europa para nos dar outro trabalho excelente com “Extermínio”. Esse seu novo filme tem todos os elementos já conhecidos do diretor, edição ágil, trilha sonora bacana e um personagem principal que come o pão que o diabo amassou. Se não é seu melhor filme pelo menos serviu pra seu trabalho ser reconhecido pelo Oscar.

quarta-feira, 18 de março de 2009

JCVD

O que esperar de um filme de Jean Claude Van Damme?Explosões, Pancadaria, más atuações? O baixinho belga, contrariando a tradição de filmes artísticos do continente europeu, fez sua fama atuando como herói em filmes Hollywoodianos de baixo orçamento cujos principais atrativos eram as lutas. “O Grande Dragão Branco”, ”Duplo Impacto”, “Retroceder Nunca, Render se Jamais” foram responsáveis por inscrever seu nome no hall dos grandes nomes dos filmes de ação dos anos 80 e 90, junto com Schwarzenegger, Stallone, Bruce Willis e Steven Seagal. O ator chegou a trabalhar no primeiro filme em Hollywood do grande mestre de ação de Hong Kong, John Woo, com o um pouco decepcionante “O Alvo”. O problema é que enquanto os três primeiros atores citados deram um jeito de não serem esquecidos, seja seguindo carreira política (Schwarzenegger) ou tentando seguir carreira mais séria (Bruce Willis), Van Damme, talvez por não ter uma visão muito de futuro ou por falta de talento artístico mesmo, acabou se restringindo a certo tipo de papel que perdeu espaço na entrada do novo milênio, o do exército de um homem só. Claro que ele não está sozinho, Steven Seagal, Dolph Lundgren, Chuck Norris e outros atores de filmes de ação também foram pelo mesmo caminho. O certo é que há mais ou menos uns 10 anos Van Damme não vem fazendo nenhum papel memorável e a maioria de seus filmes tem sido lançados diretamente no mercado de vídeo, se não me engano desde o distante ano de 1999 com “Inferno”, em que contracena com o saudoso Pat ‘Karate Kid’ Morita, nenhum de seus filmes foram lançados no cinema aqui no Brasil, daí em diante foi sempre ladeira abaixo, tendo inclusive protagonizado uma cena constrangedora aqui no Brasil ao participar do programa “Domingo Legal” usando uma calça apertada, ficou excitado com os rebolados de Gretchen e o resultado vocês podem imaginar. Vale destacar que as salas de cinema não vinham perdendo grande coisa esse tempo todo, caso algum corajoso queira conferir, as obras- primas Replicante, Hell e A Irmandade são muito fáceis de serem encontradas nas locadoras.

O caso é que o ator finalmente percebeu que sua carreira tinha ido pelo ralo e resolveu fazer esse filme intitulado JCVD, uma falsa autobiografia, que deve ter servido para que Jean-Claude Camille François Van Varenberg, mais conhecido como Jean Claude Van Damme, ou simplesmente Van Damme exorcisasse alguns fantasmas. Uso de drogas, decadencia, baixa qualidade de sua filmografia, talvez alguma coisa com seu país de origem, problemas familiares ele não se exime de expor nada de sua trajetória. A história gira em torno de Van Damme, desta vez não um personagem, mas ele mesmo, um ator decadente, cansado, se humilhando para conseguir um papel e lutando na justiça pela guarda de sua filha, um dia ele vai em uma agencia do correio e acaba se tornando refém em um assalto. Daí pensamos: agora ele vai mostrar tudo que ele conhece de artes marciais e vai salvar o dia. Nada disso, ele não pratica nenhum ato de heroísmo, por um engano a policia acredita que ele é um dos assaltantes pois por ser conhecido ele é que intermedia as negociações entre policia e criminosos. Para mostrar que nao e só mais um filme de Van Damme ele chega a se aproveitar da situação para extorquir dinheiro para pagar seus advogados o que lhe destina um fim inglório. Mesmo com todo esse drama o filme tem algumas cenas de humor como a que o advogado da mãe de sua filha começa a listar os tipos de mortes que ocorrem em seus filmes e quando ele descobre que um dos papeis que ele estava batalhando foi passado ao Steven Seagal já que esse tinha concordado em cortar o rabo de cavalo. Enquanto assistia me lembrei de um outro filme: Filho de Chucky onde Jennifer Tilly também faz seu próprio papel e não tem medo de se auto parodiar aparecendo como uma “atriz que foi indicada ao Oscar e que agora tem que se contentar em transar com um boneco”, não lembro de outros filmes que sigam esse rumo já que é mais comum atores fazerem uma avaliação de sua carreira com algum personagem de ficção e não interpretando a eles mesmo.

JCVD é provavelmente o filme do astro com menos cenas de ação, ele chega a fazer um monologo de uns 6 minutos onde comenta os aspectos negativos de sua carreira, Van Damme aparece aqui de alma lavada, alguém que cometeu muitos erros na vida mas que apenas quer seguir sua vida e fazer seus filmes, talvez seja uma oportunidade para a reinvenção do ator que já foi conhecido como “Os Musculos de Bruxelas” e acreditem se quiser, teve que escolher entre seguir carreira em filmes de karatê ou em uma companhia de balé, ninguém espera que ele esteja na próxima montagem de Hamlet de algum teatro londrino, mas Robert Downey Jr e Mickey Rourke estão aí para mostrar que com boa vontade um ator pode recuperar o tempo perdido. Mesmo que esses dois atores tenham talento muito superior a Van Damme nada impede que trabalho com bons diretores e melhores roteiros possa torna-lo um ator mais respeitado na indústria. Quem sabe o grande ressuscitador de carreiras, Quentin Tarantino , não possa resgata-lo do limbo dos astros esquecidos como fez com Pam Grier, Robert Foster e John Travolta. Não custa sonhar, não é?


Por onde andam os astros de ação dos anos 80 e 90?
Sylvester Stallone – Franquias: Rambo (6 filmes), Rocky (4 filmes). Depois de um período de vacas magras acabou conseguindo sucesso reencarnando seus principais personagens, Rocky e Rambo, e até que teve bons resultados. Trabalha em um projeto intitulado “Os Mercenários” que reuniria os grandes astros de ação e que inclusive, Van Damme se recusou a participar por ter achado o projeto muito comercial. Esse filme terá cenas no Brasil e parece que uma atriz brasileira irá participar.

Arnold Schwarzenegger – Franquias: Exterminador do Futuro(3 filmes), Conan(2 filmes). Hoje é governador da California. No cinema só participações como em Mercenários, onde aparece como ele mesmo em uma ponta. Recusou participar de Exterminador do Futuro IV para não atrapalhar suas obrigações como governador. Conan também está sendo refilmado mas ele não está envolvido.

Bruce Willis – Franquia : Duro de Matar (4 filmes). Esse é fácil, conseguiu se firmar como ator sério e sabe combinar filmes comerciais como a quarta sequencia de Duro de Matar com escolhas mais criteriosas como Nação Fast Food ou Sin City.

Steven Seagal – Franquia: Força em Alerta(2 filmes). Continua fazendo seus filminhos, nada de muito significativo, anda precisando de uma renovada também. Segundo o Wikipédia ele também é ativista de temas ambientais.

Chuck Norris – Franquia: Braddock(3 filmes) e o seriado Walker Texas Ranger(9 incríveis temporadas). Um texto o reverenciando por sua indestrutibilidade é hit na internet, e sua série Texas Ranger ainda costuma ser reprisada até hoje em vários canais, mas o ator também também não está com essa bola toda, tanto que não foi nem cotado para o novo Braddock.

Christopher Lambert – Franquia: Highlander(4 filmes) e A Fortaleza(2 filmes). Sempre foi um ator um pouco mais versátil que os demais. Esteve recentemente em “O Fim do Mundo” do diretor de Donnie Darko, Richard Kelly.

Lorenzo Lamas – Franquia: Esquadrão Cobra (3 filmes) e o seriado Renegado(5 Temporadas)O Único que tinha pais famosos, filho do argentino Fernando Lamas, galã latino em vários filmes de Hollywood e da atriz Arlene Dahl ele começou seguindo outro rumo com um personagem praticamente sem falas mas com alguma relevancia em Grease e como galã da Soap Opera Falcon Crest(uma daquelas novelas americanas interminaveis), mas depois que descobriu que tinha futuro como ator de ação ele não largou mais. Segundo o IMDB seu próximo filme tem o sugestivo título de Mega Shark vs. Giant Octopus, apesar da megalomania do titulo não esperem muita coisa.

Dolph Lundgren – Não encabeçou nenhuma franquia e ficou mais conhecido pelos papeis de vilão em Rocky IV e Soldado Universal. Poderia ter encabeçado uma franquia se os filmes Mestres do universo, adaptação do desenho do He-Man ou O Justiceiro, adaptação de um história em quadrinhos que foi recentemente readaptada, não fossem tão podreiras. Está no filme do Stallone que citei e recentemente numa pesquisa relevantíssima descobriu se que é o ator que mais matou pessoas em filmes, num total de 662. Desbancou todos os candidatos acima.

Esses eram os mais importantes e os mais fáceis de achar informações na net. Para não me chamarem de machista ainda tentei descobrir o paradeiro de Cynthia Rothrock, o único nome feminino de filmes de ação que me veio a cabeça. Mas não descobri. Quem quiser ajudar.