domingo, 29 de março de 2009

Invasão Persa

Muito se tem falado da cinematografia da Índia por causa da novela "Caminhos da Índia" e pelo filme ganhador do Oscar "Quem Quer Ser um Milionário", mas eu resolvi comentar sobre a cinematografia de um país que já esteve bastante em voga aqui no Brasil e agora deu uma sumida, no caso o Irã, cujos filmes são obras-primas para alguns e soníferos para outros. Por sorte só mais recentemente tenho tido oportunidade de ver alguns filmes iranianos depois que passou a onda de crianças e mulheres de xador nos cinemas brasileiros, pois eu tenho a convicção que com um maior distanciamento dá para ter uma visão mais independente.

Zapeando pela TV esses dias acabei passando pela TV Futura que transmitia o iraniano "O Voto é Secreto", nesse filme uma espécie de mesária itinerante sai por uma determinada região do país recolhendo votos pra eleição iraniana e se depara com várias dificuldades, entre elas a descrença da população com a política, a ignorância e ainda o preconceito contra sua condição de mulher em uma sociedade muçulmana. O filme, assim como a maioria das películas daquele país é contemplativo, trabalha muito com figuras de linguagem e não se preocupa com agilidade, talvez por esse motivo a platéia ocidental totalmente viciada em filmes com estética de videoclipe venha a penar um pouco ao acompanhar a saga da moça percorrendo uma vila remota com sua urna eleitoral, mas pode ter certeza que ninguém sai indiferente ao filme, não tem final surpresa, redenção, nada desses apelos Hollywoodianos, apenas uma câmera seguindo personagens realistas, de forma quase documental, sem se envolver e sem manipular a platéia e dando uma lição de humanidade.

Toda a cinematografia do Irã tem esse tom que lembra o neo-realismo, época em que a Itália do pós guerra tentava juntar os cacos e produziu filmes como "Ladrões de Bicicletas" de Vittorio de Sicca em que denunciavam a falta de oportunidades e a marginalização dos pobres, com pouco dinheiro e atores não profissionais selecionados entre a própria população. Da mesma forma, ainda que com sutilezas os cineastas iranianos conseguem criticar as convenções a que estão expostas a população pobre de seu país, machismo, pobreza, alienação, falta de oportunidades, anacronismo da sociedade, preconceito contra minorias. Em Filhos do Paraíso, filme mais conhecido da região, indicado ao Oscar e exibido de vez em quando nas madrugadas da Rede Globo, temos as crianças que precisam correr por um sapato, em "A Cor do Paraíso nos emocionamos com a saga do garoto cego, que é super esperto e sensível mas passa a ser um problema pro pai que quer se casar outra vez, no seguimento Iraniano do filme em episódios "11 de Setembro", uma professora tenta explicar aos seus alunos sobre o desabamento de um prédio do outro lado do mundo quando alguns nem sabem o que significa a palavra prédio, são vários os problemas que aos olhos ocidentais podem parecer ingênuos ou simples de resolver mas que pode ser uma tragédia para pessoas que vivem em condições precárias, se eu tivesse um jarro e ele quebrasse eu simplesmente iria ao mercado e compraria outro mas pense um grupo de crianças no deserto que precisam desse jarro para colocar a água que bebem na escola. Alguns desses cineastas ousam tocar até mesmo em temas tabus na sociedade islâmica, claro que não é de forma direta, precisam de metáforas e quem vê seus filmes necessita de uma visão um pouco mais apurada e imaginação para compreender seus jogos. Por Exemplo, em "Gosto de Cereja", um homem passa o filme todo procurando por alguém que o ajude a cometer suicídio, muitos críticos aventaram a hipótese de que ele fosse homossexual, mas o diretor desse filme nunca confirmou a informação e nada no filme pode dar a certeza disso. Em "O Voto é Secreto" no final temos a impressão que o soldado se apaixonou pela garota responsável pelo recolhimento dos votos, mas pode ser só uma impressão, ou não.

Por mais que essas realidades pareçam por demais distantes dá pra fazer uma analogia com a nossa, quantos no nosso país não vivem abaixo da linha de pobreza? Quantos por esses rincões nunca tiveram acesso e talvez nem tenham a coisas simples para nós da cidade como uma televisão ou mesmo comida? Se o machismo fosse coisa do passado a Lei Maria da Penha precisaria existir? Pegando "O Voto É Secreto" especificamente e trazendo pra nossa realidade é de se raciocinar quanto esse país não está contaminado por uma falsa ou equivocada noção de democracia, um país onde o coronelismo, se não é ainda tão forte, ainda não acabou. Onde muitos ainda trocam o voto por um chapéu ou um par de botinas. Então vamos assistir aos filmes que vieram do outro lado do mundo e antes de julgar, condenar ou menosprezar a realidade daquele povo vamos ver o quanto não temos que fazer de faxina em nossa própria casa.

Filmes que vi:

Como essa semana que passou eu vi um monte de filmes e fiquei com vontade de escrever sobre eles, resolvi fazer um resumão como costumava fazer no inicio desse blog.

Velocidad Funda al Olvido - Filme argentino, mais um que aparentemente procura passar a limpo os tempos da ditadura, não é ruim, mas às vezes um pouco confuso, nem sempre ele deixa claro qual caminho quer seguir e o protagonista não tem empatia suficiente, diferente da personagem da garota espanhola que o ajuda em sua via-crúcis a procura de sua mãe na Espanha, ela consegue roubar a maioria das cenas.

Dia dos Namorados Macabros 3D- A Tecnologia 3D é interessante, mas só isso não resolverá a fuga do público do cinema, ou investem em bons roteiros ou o 3D será apenas um paliativo de efeito curto, vale lembrar que esse efeito já tinha sido usado de forma mais precária nas décadas de 50 e 80 e parece gostar de ressurgir de tempos em tempos como o Jason( que aliás também teve seu filme 3D em Sexta Feira 13 parte 3). Revi também o Dia dos Namorados Macabro original de 1981, é um dos bons produtos slasher da época. A história? Alguém se importa?

Motivos Para no Enamorar-se - Outro filme argentino, estava tendo uma mostra no Espaço HSBC em São Paulo, garota com problemas em se relacionar com os homens se envolve com cara com mais que o dobro de sua idade, nossos hermanos mostram que sabem fazer uma boa comédia romântica, é um filme leve e divertido mas não é raso como um filme da Meg Ryan.

Quem Quer Ser um Milionário? - Esse todo mundo sabe qual é, o ganhador do Oscar desse ano, uma celebração do cinema de Bollywood, dirigido pelo moderninho e eclético (vou usar essa palavra mesmo não gostando dela) Danny Boyle, diferente da maioria eu gosto das obras Hollywoodianas do Boyle, “A Praia” não é o lixo todo que pregam e “Por Uma Vida Menos Ordinária” é um filme bem divertido, mas reconheço que ficam bem aquém dos geniais “Trainspotting” e “Cova Rasa” seus filmes anglicanos mais famosos e foi só ele volta a filmar na Europa para nos dar outro trabalho excelente com “Extermínio”. Esse seu novo filme tem todos os elementos já conhecidos do diretor, edição ágil, trilha sonora bacana e um personagem principal que come o pão que o diabo amassou. Se não é seu melhor filme pelo menos serviu pra seu trabalho ser reconhecido pelo Oscar.

Nenhum comentário: